Sem dano moral a medida penaliza a vítima duas vezes. Decisão merece escrutínio, debate e reparo.

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), homologou nesta quinta‑feira (3) o acordo firmado pela Advocacia‑Geral da União (AGU) e outros órgãos para ressarcir aposentados e pensionistas do INSS que sofreram descontos indevidos, por meio de associações, entre março de 2020 e março de 2025. A devolução, que deve começar em 24 de julho, será feita diretamente na folha de pagamento, em parcelas administradas com atualização pelo IPCA.
No entanto, quem arcará com o rombo não é claramente o vilão previsto no esquema: as associações. Em vez disso, a União assumirá os custos, mantendo-os fora do teto fiscal e sem indicar uma fonte específica de recursos, por meio de crédito extraordinário ou precatório, conforme autorização de Toffoli.
Críticas à letra e ao espírito do acordo
Desoneração da culpa real:
As entidades que aplicaram os descontos — muitas delas envolvidas em fraudes comprovadas pela PF e CGU — terão apenas 15 dias para responder ou devolver o valor, sob risco mínimo. Enquanto isso, é o erário que assume o prejuízo imediato.- Judicialização suspensa em favor do caixa público:
O STF suspendeu ações judiciais e prazos de prescrição, evitando a chamada “onda de judicialização”. Mas esse instrumento acaba servindo, sobretudo, para substituir culpa judicial por débito estatal – que apenas será compensado, se for o caso, após longos processos contra as associações. Fuçando no bolso do contribuinte:
A decisão de excluir o ressarcimento do arcabouço fiscal abre precedente preocupante. É uma brecha fiscal para esconder gastos emergenciais, sem previsão orçamentária, comprometendo a lógica de esforço fiscal equilibrado.- Participação limitada dos segurados:
Para receber, o aposentado ou pensionista deve aderir voluntariamente, obrigando-se a desistir de eventual processo judicial, renunciando a danos morais. Trata-se de uma escolha entre justiça individual e acesso facilitado — mas com custo institucional público.

Quem realmente pagará a conta?
Contas públicas: é o governo federal — logo, todos nós, por meio de impostos — que antecipará, sem garantia imediata de reembolso pelas entidades responsáveis.
Fundo de caixa e credibilidade: o uso de crédito extraordinário e canais não previstos mina a transparência e contamina a credibilidade fiscal.
Segurados e associações: os idosos lesados ganham rapidez, mas abrem mão de indenização por danos morais; enquanto as associações podem atrasar ou evitar responsabilização real.
A que custo moral e fiscal?
Em nome da celeridade e da segurança jurídica, o Estado assume o ônus — e reforça um círculo vicioso: pagamos adiantado por danos que não cometemos, funilando culpa e custo para o erário, enquanto o verdadeiro causador muitas vezes permanece impune.
Com isso, a pergunta que fica é: será que vale a pressa, se a transparência, a justiça e o equilíbrio fiscal estão sendo sacrificados no processo? Esta conta, no fim das contas, será quitada por toda a sociedade — e isso merece escrutínio, debate e reparo.

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