Dos serviços de esgoto para despoluir a baía de Guanabara aos contratos entre agências públicas e o Comitê Rio-2016, procuradores federais querem saber de que forma recursos públicos foram utilizados.
Para o Ministério Público Federal (MPF), a Olimpíada não terminou. OEstadão.com apurou que procuradores conduzem investigações em torno das obras do evento, com suspeitas de corrupção e improbidade administrativa. Dos serviços de esgoto para despoluir a baía de Guanabara aos contratos entre agências públicas e o Comitê Rio-2016, os procuradores federais na cidade carioca querem saber de que forma recursos públicos foram utilizados.
O presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), Thomas Bach, insistiu no fim de semana que o evento não contou com recursos públicos, o mesmo argumento usado pelo Comitê Rio-2016. Mas para o procurador da República, Leandro Mitidieri, as apurações já revelaram que pelo menos R$ 600 milhões em dinheiro dos cofres dos diferentes níveis de governo já abasteceram o evento, principalmente com subsídios para energia, segurança e transporte.
Além desses valores, o governo federal e o município prometeram mais R$ 250 milhões na semana passada. A isso tudo se soma um isenção fiscal que, segundo a Receita Federal, chegará a mais de R$ 3 bilhões para todas as empresas envolvidas até 2017.
O MP suspeita que o Rio-2016 tentou dissimular recursos públicos em suas contas, fechando um acordo de patrocínio com a Agência de Promoção de Exportações (Apex) dias antes do início dos Jogos A suspeita dos procuradores é de que o contrato não seria de patrocínio, mas apenas um mecanismo para garantir dinheiro público no evento, o que estaria proibido pela Justiça.
O dinheiro acordado numa primeira parcela seria de R$ 25 milhões Mas a suspeita é de que a verba seria usada sem qualquer contrapartida real para a Apex. Com o patrocínio, o Rio-2016 não precisaria ter suas contas avaliadas pelo Tribunal de Contas da União. Mas, se o contrato é apenas uma forma de dissimular novos recursos, isso implicaria maior fiscalização.
O contrato com a Apex foi fechado no dia 4 de agosto e supostamente para ter a agência estatal explorando sua marca nos Jogos. O MP suspeita de que não houve sequer tempo para garantir essa exploração. “Se houve essa simulação de contratos, poderia ser uma improbidade administrativa”, disse o procurador, que afirma não ter garantias de que outros contratos com estatais não estejam sendo desenhados da mesma forma.
A Apex indicou que o contrato de patrocínio envolveu uma projeção, durante a festa de encerramento, de uma campanha internacional para promover o Brasil pelo mundo. As imagens foram colocadas no gramado do Maracanã. Foram apenas alguns minutos, mas o suficiente para justificar o patrocínio que a agência deu ao Comitê Rio-2016. O MP vai apurar essa projeção para entender de que forma a agência estatal pretende usar seu direito de patrocinador.
Na última segunda-feira no Rio, a agência e o Ministério das Relações Exteriores lançaram a nova estratégia de promoção das exportações e de atração de investimentos estrangeiros. O presidente da Apex, Roberto Jaguaribe, insistiu que o dinheiro da agência não vinha do orçamento público.
Na semana passada, o governo de Michel Temer anunciou que, junto com a prefeitura do Rio, daria R$ 250 milhões para garantir a realização dos eventos.
Outra suspeita sob apuração é o sistema de limpeza da Baía de Guanabara, uma das obras prometidas para garantir competições no local. Segundo Mitidieri, as estações de tratamento de fato foram construídas. “Mas o sistema opera apenas pela metade”, apontou, sugerindo que está avaliando para onde teria ido os recursos.
O MP Federal ainda apura documentos que apontam também para suspeitas relativas às obras do Parque Olímpico da Barra, além de fazer um pente fino em todos os contratos e acordos entre o Comitê Olímpico do Brasil e o Ministério dos Esportes. Parte dos recursos usados para as obras do Complexo de Deodoro está bloqueado. “Essa investigação corre sob sigilo de justiça”, disse o procurador.
TRANSPARÊNCIA
Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Rio-2016, insiste que não existe obrigação de a entidade abrir suas contas, já que se trata de uma empresa privada.
Foi apenas na semana passada e sob forte pressão que os organizadores divulgaram no site do Comitê Rio-2016 os balanços financeiros dos últimos anos. Mas sem detalhamentos suficientes.
Nos documentos, fica claro que os oito diretores-executivos da entidade ganharam R$ 26 milhões em apenas quatro anos como salários. Os dados não incluem 2016, ano de maior pagamento.
Procurado para falar sobre a investigação, a assessoria de comunicação do Rio-2016 não respondeu aos e-mails enviados. Uma coletiva que estava marcada para ocorrer na segunda-feira com a participação dos organizadores acabou sendo cancelada. Nuzman chegou a falar com os jornalistas, mas apenas sobre o desempenho esportivo do Brasil e não entrou em detalhes sobre a organização do evento.