É um crime difícil de reprimir sem uma estratégia específica avalia.
Passageira cochilava no ônibus quando foi acordada pelos gritos de um assaltante. O homem subiu no veículo e, sem passar pela roleta, avisou que estava armado. Obrigou um passageiro a recolher os celulares de todos que estavam a bordo, e, com os aparelhos em mãos, desceu em seguida. A ação, que durou poucos minutos, aconteceu ontem de manhã, em um coletivo da linha 306 (Castelo-Praça Seca), e está longe de ser um caso isolado. A cada 30 minutos, um ônibus é atacado no Rio.
Enquanto caíram os números de roubos a pedestres, de carros e de cargas, nos cinco primeiros meses do ano, a quantidade de passageiros que foram vítimas de ladrões explodiu. Foram registrados 7.466 roubos a coletivos, um aumento de 18,2% em relação ao mesmo período de 2018. O resultado é também o pior da série histórica iniciada em 1991, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP).
Fiquei nervosa. Faço esse trajeto há 20 anos e nunca tinha passado por isso. Temi porque o ladrão poderia querer fazer algo com o passageiro que estava recolhendo os celulares. Algumas pessoas estavam demorando para entregar. Eu nem vi se ele estava armado, mas não pensei duas vezes antes de entregar o meu aparelho contou Mônica, que fez o registro de ocorrência de roubo por meio do site da Polícia Civil.
As delegacias que mais registraram esse tipo de crime foram a 21ª DP (Bonsucesso), com 778 casos, a 59ª DP (Duque de Caxias), com 397 roubos, e a 7ª DP (São Cristóvão), com 348.
Um professor, conta que já foi assaltado duas vezes no trajeto da Zona Oeste para o Centro da cidade. Em uma das ações, há dois anos, ele teve o relógio roubado. No caso mais recente, ocorrido em novembro, ele entregou o celular para o criminoso.
Eu peguei o 315 (Recreio X Central) e percebi que dois homens embarcaram antes de o ônibus entrar na Linha Amarela. Um deles foi para o fundo do veículo e o outro ficou antes da roleta, fingindo que estava com problemas para passar o cartão. Assim que o ônibus entrou no túnel, eles anunciaram o assalto e pediram os celulares. Um dos passageiros disse que não tinha celular porque já tinha sido roubado na semana anterior. Depois que eles saíram, soube que aqueles mesmos assaltantes faziam isso frequentemente naquela mesma linha e naquele mesmo horário conta o professor.
Especialista sugere estratégia específica
Especialista em Segurança Pública, o ex-chefe da Polícia Civil Fernando Veloso afirma que, diferentemente de outros crimes, o roubo em coletivos exige uma estratégia específica da polícia.
Esses criminosos atuam no vácuo do policiamento, quando percebem que não há vigilância. É um crime difícil de reprimir sem uma estratégia específica avalia.
Entre as medidas que poderiam ser adotadas para reduzir o problema, Veloso cita a instalação de botões de pânico em coletivos e agilidade na troca de informações entre a polícia e o sistema de transportes, para que as imagens captadas nos veículos sejam transmitidas de forma mais rápida para a polícia.
Em linhas que sejam mais frequentemente alvos desses criminosos, a polícia poderia tentar ações específicas, mas elas vão causar transtornos e é preciso ter a compreensão da população, como abordagens programadas e policiais infiltrados dentro dos ônibus, não para reagir, mas para acionar viaturas que estivessem em pontos chave da via diz.
Para o especialista, o aumento nos casos de roubos de coletivo está relacionado a questões sociais.
Isso não é algo de organizações criminosas. A causa e origem desse crime está relacionada às questões sociais. Quanto mais desenvolvimento econômico e social a gente tiver, a maior a probabilidade de queda na incidência desse tipo de crime afirma Veloso.
Professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj, Alba Zaluar aponta outra possibilidade para o aumento dos roubos em coletivos: uma mudança no perfil dos criminosos.
O aumento aconteceu nos primeiros cinco meses do ano, coincidindo com um recrudescimento da repressão ao tráfico, inclusive com ações de helicópteros. É possível que haja uma migração de um crime para o outro. Por conta da forte repressão nas favelas, criminosos podem estar mudando de atividade avalia ela.
O porta-voz da PM, coronel Mauro Fliess, disse que os casos em junho, ainda não divulgados oficialmente pelo ISP, mostram queda. O resultado parcial aponta 1.122 registros no mês passado, redução de 17% em relação a 2018:
Isso sinaliza que as ações que implementamos, como reforço nos horários de maior circulação de veículos e policiamento nos ônibus, estão tendo sucesso.
Fonte: Jornal Extra