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BRASIL BATE RECORDE DE ENDIVIDADOS

 Juros elevados e os mais pobres recorrendo ao crédito para fazer frente a despesas do dia a dia, o recorde poderá ser quebrado novamente

Os dois indicadores bateram recordes em 2022, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

E, com juros elevados e os mais pobres recorrendo ao crédito para fazer frente a despesas do dia a dia, o recorde poderá ser quebrado novamente este ano, prevê a entidade empresarial.

Para endereçar o problema, o governo federal espera lançar ainda em fevereiro o programa Desenrola, de renegociação de dívidas.

Os detalhes do programa uma das promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – ainda não foram divulgados, mas a expectativa é de que a iniciativa priorize cerca de 40 milhões de brasileiros endividados com renda até dois salários mínimos (R$ 2.604, em valores atuais).

O governo também pretende lançar ainda este mês o novo Bolsa Família, que deve substituir o programa Auxílio Brasil, criado pelo governo Jair Bolsonaro (PL).

A mudança preocupa famílias de baixa renda que se endividaram com o empréstimo consignado do Auxílio Brasil – cujas parcelas são descontadas diretamente do benefício pago pelo governo federal. Elas temem mudanças no Cadastro Único e a possibilidade de serem excluídas do programa, ficando com a dívida do consignado para pagar.

O que explica o recorde de endividados

Em 2022, a cada 100 famílias brasileiras, 78 estavam endividadas. O patamar é o mais elevado da série histórica da Peic, com início em 2010.

Entre 2020 e 2022, a proporção de famílias endividadas passou de 66,5% para 77,9%, uma alta de 11,4 pontos percentuais.

No período, a taxa básica de juros da economia brasileira (Selic) foi elevada de 2% para os atuais 13,75% – nível que tem sido motivo de embates entre o governo e o Banco Central.

Izis Ferreira, economista da CNC, afirma que três fatores contribuíram para esse recorde de endividamento em 2022: a alta da inflação até a metade do ano, que corroeu o poder de compra das famílias; o incentivo crescente ao uso do cartão de crédito, através da oferta de novos produtos e serviços por bancos e fintechs; e, para os mais ricos, a demanda represada por serviços, como viagens e compra de passagens aéreas, geralmente pagos no cartão.

“A face negativa desse maior endividamento é a inadimplência, que também chegou a proporções recordes”, observa a analista.

Em 2022, a proporção de famílias brasileiras com contas em atraso chegou a 28,9%, também maior patamar da série histórica da Peic.

“Quando você tem mais dívidas no seu orçamento, num momento em que ainda tem uma inflação que incomoda, é mais difícil gerir esse orçamento e pagar tudo em dia”, diz Ferreira.

“O desafio para o consumidor hoje é pagar tudo isso num cenário de juros altos, porque os juros elevados aumentam o valor da dívida. Eles dificultam a renegociação e o pagamento de dívidas atrasadas. E esse contexto deve permanecer no ano de 2023”, prevê.

Segundo a economista, os juros de mercado – que chegaram a uma média de 52,1% ao ano para pessoas físicas em 2022, segundo dados do Banco Central – vão continuar elevados, devido à alta da inadimplência, do risco de não pagamento e da perspectiva de desaceleração da atividade econômica e do emprego neste ano.

“Nesse contexto de juros altos, teremos em 2023 mais famílias com dificuldades para pagar dívidas em dia e aquelas que já estão atrasadas vão enfrentar muita dificuldade de renegociar.”

Quem são os endividados: mulheres, jovens, de baixa escolaridade

Segundo a pesquisa da CNC, o endividamento tem rosto no Brasil: de mulher, com menos de 35 anos, ensino médio incompleto e moradora das regiões Sul ou Sudeste.

Em 2022, do total de mulheres, 79,5% se endividaram, comparado a 76,7% dos homens.

Entre as famílias lideradas por pessoas sem ensino médio completo, 31,2% tinham dívidas em atraso, comparado a 25,8% das famílias de pessoas com segundo grau completo.

“As mulheres trabalham mais na informalidade e em tempo parcial, e muitas são chefes de famílias, então elas têm uma condição de vulnerabilidade no mercado de trabalho maior do que os homens”, observa Izis Ferreira, da CNC.

“Com renda instável, o risco de atrasar dívidas é maior. E, como as mulheres usam modalidades de crédito de pior qualidade, quando essas dívidas atrasam, elas vão ficando muito caras.”

Para as mulheres, a principal forma de endividamento é o cartão de crédito e o carnê de loja, observa a economista.

E o perfil das dívidas no cartão revela como essa modalidade de crédito tem sido usada como uma extensão do orçamento das famílias: das dívidas com cartão de crédito, 65% são referentes a compras no supermercado, e 41% a compra de remédios ou tratamento médico, segundo o Perfil e Comportamento do Endividamento Brasileiro 2022, da Serasa.

“O cartão é um crédito de acesso muito fácil, oferecido inclusive pelo varejo e com limites baixos, que facilitam esse acesso”, observa Patrícia Camillo, gerente da Serasa.

“Ele ainda é visto como um valor adicional ao orçamento mensal. As pessoas adquirem o cartão para fazer compras básicas, já considerando que, sem o cartão, o orçamento não é suficiente. Esse comportamento é o perigo do cartão e o que leva ele a ser o Top 1 das dívidas.”

Em 2022, o juro médio cobrado pelos bancos no rotativo do cartão chegou a 409,3% ao ano, uma alta de 61,9 pontos percentuais em relação a 2021, quando o juro foi de 395,4%. Assim, essa modalidade de crédito é uma das mais caras do mercado, junto ao cheque especial.

Ainda segundo os dados da Serasa, o país tinha 69,4 milhões de inadimplentes em dezembro de 2022 e o valor médio das dívidas por pessoa era de R$ 4,5 mil, somando um total de R$ 312 bilhões em dívidas em atraso.

Os novos endividados do consignado do Auxílio Brasil

Em 2022, um outro fator contribuiu para o aumento do endividamento entre os mais pobres no Brasil: a criação, às vésperas da eleição, do empréstimo consignado do Auxílio Brasil.

O empréstimo foi liberado em 10 de outubro, entre o primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais em que o então presidente Jair Bolsonaro (PL) tentava a reeleição. Somente naquele mês, a modalidade movimentou mais de R$ 5 bilhões, segundo o Banco Central.

Quem tomou o empréstimo consignado em outubro, desde novembro está tendo seu Auxílio Brasil descontado. Quem recebia R$ 600, agora recebe R$ 440 após o pagamento da parcela mensal.

“Está sendo difícil, mas eu tinha ciência que ia estar sendo descontado”, diz Elisângela Cruz César, de 43 anos e moradora de uma área invadida na zona norte de São Paulo.

Elisângela conta que nunca tinha pegado um empréstimo na vida, o consignado do Auxílio foi sua primeira vez no mercado de crédito, já que nem cartão de crédito ela usa.

“Todo mundo que tinha o benefício e estava passando necessidade foi [fazer o empréstimo], nem pensou, porque quem tem criança não vai querer passar dificuldade. Era minha única opção, então eu fui e fiz”, lembra.

“Mas agora é bem preocupante, porque mudou o presidente e a regularização do CadÚnico [Cadastro Único] vai mudar muita coisa. Vai que de repente cancela, faz alguma coisa no benefício? Aí ou a gente paga [a dívida do consignado] por fora, ou então acaba sujando o nome da gente, que vai ficar com uma dívida nas costas”, diz a mãe de família.

No início deste mês, o novo governo mudou as regras do consignado para beneficiários do Auxílio Brasil.

Com a mudança, o desconto mensal máximo do benefício para pagamento das parcelas passa a ser de 5%. Antes, chegava a 40%.

A taxa de juros agora não vai poder passar de 2,5% ao mês e o número de parcelas não pode ser superior a seis. Anteriormente, o limite de juros era de 3,5% ao mês e o número máximo de parcelas chegava a 24.

As novas regras, no entanto, valem apenas para novos empréstimos.
 
Ansiedade, insônia, depressão
Para além do nome sujo – que dificulta a obtenção de novos créditos e financiamentos –, o aumento da inadimplência no país também tem efeito sobre a saúde e os relacionamentos familiares dos brasileiros.

Segundo a pesquisa da Serasa:
83% dos endividados têm dificuldade para dormir por conta das dívidas;
78% têm surtos de pensamentos negativos devido aos débitos vencidos;
74% afirmam ter dificuldade de concentração para realizar tarefas diárias;
62% sentem impactos no relacionamento conjugal;
61% vivem sensação de “crise e ansiedade” ao pensar na dívida;
53% revelam sentir “muita tristeza” e “medo do futuro”;
51% têm vergonha da condição de endividado;
33% não se sentem mais confiantes em cuidar de suas próprias finanças;
31% sentem impacto das dívidas no relacionamento com familiares.
 
 

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