Votação terminou em 47 a 19 para a extinção do programa.
A oposição na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) foi derrotada. Está decretado o fim do Supera RJ, dentro de 60 dias. O prazo de “aviso prévio” do programa, que visa dar a famílias sem renda uma quantia para a subsistência, foi negociado em um colégio de líderes entre a base do governador Cláudio Castro (PL) e a oposição. A votação, realizada na noite desta quinta-feira (29), terminou em 47 a 19 para a extinção do programa, sem abstenções.
Apesar de ter sido rascunhado na quarta-feira um prazo para o fim do programa, como forma de mitigar os danos que o fim do projeto causaria às mais de 60 mil famílias abarcadas, a oposição votou com pesar. E sem deixar as críticas ao governador de lado.
Não conseguimos salvar o Supera RJ. E a Alerj tem mais culpa que o governo –, disse o deputado estadual Yuri Moura, do PSOL.
O deputado Flávio Serafini (PSOL) explica que a negociação com os apoiadores de Castro se deu por uma decisão estratégica para não desassistir os beneficiários de uma hora para outra. Ele revela que haverá uma movimentação política entre os deputados que foram contrários à extinção do projeto para, junto ao governo federal, enquadrar os desassistidos no programa Bolsa Família.
Consideramos um erro grave o governo abrir mão de ter um programa próprio de enfrentamento a extrema miséria, pra ser complementar ao bolsa família.
A deputada estadual Verônica Lima (PT) foi outra parlamentar que foi contra o fim do Supera RJ. Segundo a política, a finalidade do programa criado para conceder renda a famílias pobres afetadas pela Covid-19 se manteve, mesmo com o fim da pandemia.
É importante lembrar que este é o único programa de transferência de renda do Governo Estadual e o seu encerramento significa o fim da única fonte de renda para muitas pessoas vulneráveis. Por esse motivo a bancada do PT apresentou uma emenda estendendo o Supera RJ até 2032, mas infelizmente fomos derrotados pelo governo, destacou à coluna.
Do outro lado do espectro político, a base do governador na Casa Legislativa não se manifestou. Como foi apurado pela reportagem, a ordem do Palácio Guanabara – sede do governo do estado do Rio era de que nenhum deputado comentasse sobre o fim do programa.
Quando encaminhou o projeto de lei, o governador Cláudio Castro alegou dificuldades orçamentárias para a continuação do Supera RJ.
Em fevereiro, o programa chegou a ter o período de concessão do benefício prorrogado até dezembro, quando seria finalizado. O texto que levou à extensão do prazo foi da parlamentar Renata Souza, do PSOL.
O que diz a Defensoria
No documento, a Defensoria Pública do Estado do Rio (DPRJ) argumenta que o estado “tem o dever de adotar iniciativas para a manutenção e ampliação dos postos de trabalho, abertura de linhas de crédito, prorrogação e ampliação de programas de renda mínima, além de estratégias para aumentar e estimular o mercado consumidor”.
“A transferência de um valor mínimo de R$ 250 representa, para a maior parte das famílias beneficiadas, a única fonte de renda para a compra de alimentos”, afirmou a Defensoria.
O órgão pediu informações atualizadas acerca do número de famílias cadastradas no Supera RJ e quantas delas seriam elegíveis nos programas de transferência de renda do governo federal, além de um estudo detalhado que comprove a necessidade de extinção imediata do benefício.
A defensora pública e coordenadora de Tutela Coletiva da DPRJ Raphaela Jahara, que assina a recomendação, lembrou que o RJ teve um aumento de pessoas em situação de extrema pobreza em 36%, e o encerramento do Supera RJ deixará mais de 60 mil famílias, possivelmente, em situação de insegurança alimentar.
“É importante destacar que não houve justificativa pelo Executivo nem apresentação de estudo que justifique a extinção do benefício. Além disso, o Supera RJ não vai de encontro ao regime de recuperação fiscal. A lei que se objetiva revogar assegura a sua vigência até o final de 2023, e não há nenhuma comprovação de mudança na situação de vulnerabilidade da população fluminense apta a justificar o fim do pagamento do programa”, destacou.
Para a defensora Samantha Oliveira, responsável pelo Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria, é importante que o estado, caso entenda pela extinção imediata do benefício, restabeleça outros programas de transferência de renda.
“Pois assim será possível assegurar a pelo menos 64 mil famílias que não fiquem em situação de extrema pobreza”, afirmou.
Decisão divide opinião de deputados
Às vésperas da votação do projeto de lei que extingue oficialmente o Supera RJ, a percepção na Alerj era mista. De um lado, deputados da oposição estavam inconformados com o pedido do governador Cláudio Castro (PL). Do outro, a sua base na Assembleia, segundo apurado, se divertia com o “sofrimento” de seus detratores. Fato é que, dentre os deputados estaduais ligados ao governo, uma ordem impera: não se comenta sobre a ação que pede o fim do Supera RJ.
Acabar com o benefício sem aviso prévio ou preparação irritou a ala que, por meses, lutou para a extensão do período de concessão do Supera RJ. A parlamentar Renata Souza, do PSOL, é um desses nomes. A deputada havia conseguido na casa a prorrogação da concessão do benefício, que seria finalizado em dezembro deste ano.
É covardia acabar com um programa que socorre famílias em extrema pobreza –, afirma a deputada.
Do outro lado da ponte, na base do governo, nenhum deputado aceitou conceder entrevistas. Segundo apurou a reportagem, há um comando do alto escalão do estado para que nada seja comentado à imprensa a respeito do fim do benefício.
O fim do Supera RJ
O Governo do Estado do Rio enviou projeto de lei à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), no último dia 22, para encerrar imediatamente o programa Supera RJ – programa assistencial que garantia renda mínima para famílias de baixa renda fluminenses. Um decreto do governador Cláudio Castro estendia o programa até o fim do ano, o que pode não acontecer mais.
Em entrevista, o subsecretário de Governança do Estado, José Carlos Costa, disse que o último pagamento do programa caiu na conta dos beneficiários na semana passada, e que as famílias com repasses atrasados ainda devem receber. O argumento é de que o auxílio estadual foi criado como uma medida emergencial de combate à pandemia de Covid-19, e que o pagamento deverá ser suspenso por conta de obrigações previstas no Regime de Recuperação Fiscal.
Fizemos uma dupla verificação para que ninguém ficasse de fora, por isso houve esse atraso. Todo mundo vai receber, todos elegíveis vão receber.
O subsecretário também negou em entrevista ao telejornal que o governo não tenha se planejado para o fim do programa. Apesar disso, ele admitiu que, no pagamento da 24ª parcela do benefício, o estado “foi pego de surpresa” pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que no início de maio decretou o fim da emergência em Saúde da pandemia da Covid-19.
A intenção do nosso governo era que o programa fosse até dezembro, todavia não podemos permanecer com o pagamento uma vez que estamos no Pacto da Recuperação Fiscal e com o fim da emergência da pandemia ficamos obrigados por lei a encerrar o programa – afirmou.
De acordo com o subsecretário, os beneficiados têm ainda 90 dias para sacar o que está na conta em que receberam o benefício.
Em dois anos, o governo do RJ gastou R$ 942 milhões com o programa de transferência de renda. Do total, R$ 642 milhões foram usados diretamente no pagamento dos auxílio, e outros R$ 300 milhões na concessão de microcrédito aos beneficiários. Ao longo dos anos de projeto, 471.372 pessoas foram beneficiadas. Hoje, o Supera RJ tem 64.921 beneficiários ativos.
Irregularidades
Em março, uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado concluiu servidores públicos, presidiários, mortos e até o dono de uma aeronave receberam benefícios do programa Supera RJ, do Governo do Estado. Técnicos do tribunal identificaram várias irregularidades. Os auditores analisaram gastos de março de 2021 a março de 2022, que somaram mais de R$ 285 milhões.
A investigação apontou que o auxílio emergencial de renda mínima foi concedido irregularmente a agentes públicos, presidiários em regime fechado, pessoas com registro de óbito e beneficiários com sinais de riqueza.