Argentina, Brasil e Paraguai temem que acordo bilateral entre os países possa rachar o bloco.
O Uruguai não escondeu que vai continuar avançando nas negociações bilaterais com a China. Durante a visita de Luís Inácio Lula da Silva (PT) ao país, o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, declarou que não tinha problemas em informar o Brasil e Argentina sobre o que está negociando com os chineses e defendeu a necessidade de fazer esse acordo para o desenvolvimento do seu país.
Um dia antes, durante a participação na 7ª cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), ele já havia proposto o impulsionamento da criação de uma área de livre-comércio regional. “Não seria o momento de tornar essas relações mais sinceras e que se impulsione, a partir da Celac, uma área de livre-comércio do México até o sul da América do Sul? Não podemos avançar nesse sentido?”, questionou. “Temos a possibilidade de fazer comércio livremente. Muitas de nossas economias são complementares, e tenho certeza de que poderíamos avançar”, argumentou Lacalle Pou no momento em que seu país está sob pressão no Mercosul após a decisão de negociar um tratado de livre-comércio (TLC) com a China.
A negociação avança após a realização de um estudo de viabilidade, deixando a situação tensa para Argentina, Brasil e Paraguai – outros integrantes do Mercosul -, que chegaram a ameaçar Montevidéu com medidas legais e comerciais. O Uruguai também se inscreveu para aderir ao Acordo Transpacífico. O presidente uruguaio, no entanto, assegura que não se opõe à participação de outros membros do Mercosul no acordo com o país asiático e destaca que “o Mercosul é a quinta região mais protecionista do mundo”. Ele também reforçou que seu país não é “divisionista”. “Nunca dissemos ‘vamos abandonar o Mercosul’”, insistiu. A aproximação dos uruguaios com os chineses é vista com receio por Brasil, Argentina e Paraguai porque temem que possa representar um problema para o bloco. Amâncio Jorge de Oliveira, especialista em ciência política pela Universidade de São Paulo (USP), fala que essa aproximação pode trazer tremendas consequências e impactos e ser um “bomba atômica”. “O Mercosul tem regras de acordos comerciais. Se o relacionamento bilateral entre os países acontecer, haveria um nível de competitividade do produto chinês em relação ao Uruguai com proporção a tomar os outros países da América do Sul via essa porta de entrada, também bastante contundente, e seria para o Mercosul uma coisa bastante complexa”.
Luiz Fernando Paulillo, doutor em economia e diretor do Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia da Universidade Federal de São Carlos (UFScar), afirmou que o que Uruguai está fazendo com a China preocupa os outros países, porque essa sinalização é uma ameaça à constituição do Mercosul.
Lula expressou o desejo de fortalecer o bloco. “Concordamos em discutir reformas no Mercosul. O que precisamos fazer para modernizar o Mercosul? Queremos sentar à mesa primeiramente com nossos técnicos, depois com nossos ministros, e finalmente com os presidentes para que a gente possa renovar aquilo que for necessário renovar”, disse Lula em resposta ao presidente do Uruguai, que falou sobre a necessidade de ter um bloco mais “moderno, flexível e aberto ao mundo”. Lacalle Pou expressou sua satisfação com o apoio do Brasil ao “aprimoramento do Mercosul”. O Uruguai pede há anos uma maior flexibilidade ao Mercosul, assim como avanços nas negociações comerciais com a UE, um pedido que Lula considerou “mais do que justo”. “É justo querer produzir e vender mais. Por isso, é importante se abrir o máximo possível para o mundo dos negócios”, afirmou o presidente do Brasil.